AAAPV

O sucesso da autogestão

Aurélio Brandão

Bacharel em direito, fundador da Autobem Brasil, e co-fundador e 2º vice-presidente da AAAPV

A terceira edição da pesquisa O Perfil do Caminhoneiro Brasileiro, divulgada pela revista Childhood Brasil¹, destaca que o nível de escolaridade dessa categoria subiu nos últimos dez anos, uma vez que a maioria dos profissionais entrevistados possuía ensino médio completo. Esse estudo apontou que o baixo nível escolar não é bem visto pelas empresas, já que determinadas cargas, rotas e caminhões exigem motoristas com maior qualificação. Em relação à renda familiar, nos últimos cinco anos, o valor médio aumentou em torno de R$ 200, o que representa uma queda no poder aquisitivo, se comparado à variação do salário mínimo entre os anos de 2010 e 2015.

Levando em consideração o aumento expressivo da frota de caminhões, o nível de escolaridade e a queda do preço do frete em determinadas regiões, o caminhoneiro passou a conhecer os verdadeiros riscos da profissão. Ao comparar essas ameaças com os valores dos seguros dos caminhões, os profissionais das estradas encontraram o ponto de desequilíbrio do risco real e do risco imposto pelas seguradoras e, com a perda do poder aquisitivo, tiveram que colocar em prática um novo modelo de proteção, em que a mutualidade oferecida pelas associações de classe foi a única forma viável de trazer segurança para os bens, viabilizando o exercício da profissão.


DESINTERESSE DAS SEGURADORAS

No ano 2000, os seguros de veículos pesados no mercado representavam aproximadamente 4% do número total de automóveis protegidos no Brasil. O custo do prêmio era um dos principais impeditivos para o crescimento acelerado desse segmento. Em média, o preço do seguro anual de um caminhão varia entre 10% e 12% do valor nominal do veículo, sendo que, para os carros de passeio, esse valor cai para 5%.

De acordo com uma estimativa do Sindseg/SP (Sindicato das Empresas de Seguros, Resseguros e Capitalização)², as altas taxas de roubo e os baixos índices de recuperação são as principais justificativas para os custos elevados. No entanto, apesar das altas taxas cobradas, o mercado de seguros para caminhões cresce a cada dia.

O presidente da comissão de automóveis do Sindseg/SP, Ademar Fujii, afirma que, atualmente, menos de 10% dos caminhões roubados são localizados.2 Esse fato fez com que os caminhoneiros percebessem que gastavam a metade do valor cobrado pela seguradora ao tomarem cuidados como rastrear, marcar e evitar estacionar os próprios veículos no pernoite em pontos críticos.

Por outro lado, a expansão de crédito fácil para financiamento de veículos leves deixou que as seguradoras diversificarem investimentos nos seguros de automóveis, pois a pulverização do risco nos veículos leves crescia absurdamente a cada ano. Dessa forma, o mercado de seguros para caminhões não interessava à carteira das seguradoras brasileiras.


EVOLUÇÃO DA FROTA

O desafio enfrentado hoje pelas transportadoras brasileiras supera a oferta das tecnologias. Parece ironia, mas, de acordo com a CNT (Confederação Nacional do Transporte), o Brasil possui uma malha rodoviária de 1.584.402 km, sendo que apenas 220.378 km são pavimentados. O fluxo é de 2.414.721 veículos não articulados. Desses caminhões, 606.646 são cavalos mecânicos articulados, 995.094 são reboques e 896.354 são semirreboques. Os números deixam claro que nossa malha viária é de baixa qualidade e não vai ao encontro das necessidades logísticas de um país com dimensões continentais. Um estudo realizado pela consultoria de negócios Bain & Company aponta que o Brasil precisaria de 21.000 km de autoestradas para aumentar a integração nacional e melhorar a mobilidade rodoviária.

 

Esse gráfico apresenta a evolução anual do crescimento da frota de caminhões nos últimos 10 anos. A taxa de crescimento é calculada considerando o ano base versus o ano anterior. O crescimento acumulado no período dos veículos do tipo “Caminhão” foi de 45%; os do tipo “Caminhão-trator” apresentaram crescimento acumulado de 99%; e os do tipo “Semirreboque” cresceram 80%. Já o aumento anual dos veículos do tipo “Caminhão” foi em média 4%; o do tipo “Caminhão-trator” foi em média 8%; e o do “Semirreboque” foi de 7%.

Com o aumento da frota e o desinteresse das seguradoras pelo mercado de veículos pesados, criou-se uma lacuna no mercado de seguros, que obriga a categoria responsável pelo transporte brasileiro fazer uma autogestão de os riscos, por meio de associações e/ou cooperativas mútuas. Concluo, meditando nas brilhantes palavras do Dr. Raul Canal3:

“Ante a incompetência do Estado para regular o mercado, esse mesmo cidadão que tem de se preocupar com a saúde, com a educação, com a segurança, que além de pagar religiosamente os seus impostos para ter direito a esses serviços básicos (que o Estado vende, mas não entrega), que paga altos pedágios nas rodovias privatizadas, porque o Estado não consegue prover a infraestrutura, esse mesmo cidadão que, rejeitado pelo mercado segurador convencional, já havia se reunido em associação ou cooperativa para proteger o seu patrimônio para fazer uma das tantas coisas para as quais, apesar de seu dever constitucional, o Estado se mostra incompetente para executar.”3

 

Referências

  1. REVISTA CAMINHONEIRO. Quem é o caminhoneiro brasileiro? Portal da internet Revista Caminhoneiro, 28 jun. 2016. Disponível em: <http://bit.ly/2uNq8To>. Acesso em: 11 jul. 2017.
  2. KLAVA, Luis Fernando. Caminhão dobra participação em seguro de veículo Caminhão já representa 8% dos seguros para veículos. Portal da internet Revista Cobertura, 2003. Disponível em: <http://bit.ly/2uNbWtx>. Acesso em: 11 jul. 2017.
  3. REVISTA AAAPV. Revista AAAPV, Brasília, ano 1, ed. 1, abr. 2017. Disponível em: <http://bit.ly/2v99Zaj>. Acesso em: 11 jul. 2017.

 

Foto: Reprodução