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Roubos sobem até 100% no Rio com a redução do isolamento social da pandemia

Passageiros de ônibus sofreram tentativa de assalto na Avenida Brasil, e policial reagiu

Por Extra

A flexibilização das restrições de circulação adotadas durante a pandemia da Covid-19 e o aumento de pessoas nas ruas indicam um efeito colateral que já pode ser notado nas estatísticas dos crimes no estado. Dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) revelam que, comparando os meses de maio (quando poucas pessoas circulavam nas ruas por conta das medidas restritivas) e julho (com o afrouxamento das regras), houve uma tendência de aumento dos registros diversas modalidades de roubo: em ônibus, de veículos, a pedestre, de celular e ao comércio. Em alguns casos, os crimes de oportunidade, como são chamados por especialistas, chegaram a dar um salto de 101% numa comparação entre os dois meses. Foi o que aconteceu, por exemplo, com os roubos em ônibus.

Em maio, com o isolamento no auge e pouca gente nas ruas, foram 420 registros deste crime. Já em julho, após a volta do comércio e a reabertura dos shoppings — levando, consequentemente, a uma maior circulação de pessoas — o número pulou para 846 casos registrados.

Em agosto, o roubo em coletivo caiu para 671 casos (queda de 21% em relação a julho). Apesar de o índice continuar acima do registrado em maio, se manteve abaixo do verificado em janeiro e fevereiro. Os demais roubos apresentaram o mesmo perfil: os números após a flexibilização se mantiveram abaixo das ocorrências no início do ano.

Outro crime que aumentou com a flexibilização foi o roubo de veículos. Em maio, foram roubados 1.586 veículos no estado. Em julho, o número saltou para 1.819 registros deste tipo. Um aumento de 14,6%. Já em agosto, foram registrados 1.793 roubos deste tipo.

Outros delitos que tiveram aumento na comparação maio e julho foram roubo de celular, roubo a pedestre e roubo ao comércio. Este último, no quinto mês de 2020 , apresentou um total de 169 registros. Em julho, foram 228 casos, um aumento de 34,9%. O número de ataques aos pedestres também subiu. Foram 2.451 vítimas em maio, contra 3.852 em julho ( 57% a mais na comparação entre os dois meses). Já em agosto, foram 3.486 casos (queda de 9,5%).

Os roubos a veículo e a estabelecimento comercial tiveram um comportamento um pouco diferente dos demais. Após a queda em maio, os dois índices não tiveram uma subida abrupta nos meses seguintes, mantendo-se perto do patamar mais baixo.

Quando o crime termina em morte

Um roubo em ônibus mudou para sempre a vida da família do enfermeiro Luiz Otávio Rodrigues da Silva, de 27 anos. No último dia 15, após um plantão em um hospital particular de Niterói, ele viajava em ônibus que cruzava a Avenida Brasil, para chegar em casa, na Baixada Fluminense. Com o casamento marcado para o mês de novembro com Renan Moreira, de 24, e usando fones de ouvido, Luiz não ouviu dois homens anunciarem um assalto. Ele acabou levando um tiro na cabeça. Chegou a ser levado para o Hospital Getúlio Vargas, na Penha, mas não resistiu à gravidade do ferimento.

— Ele não esperava que num momento entrariam duas pessoas armadas para tirar dele o celular e a vida — disse Renan.

Dois dias após a ação que levou à morte de Luiz Otávio, um novo roubo a ônibus na Avenida Brasil terminou com o suspeito do assalto morto, após um policial reagir durante o roubo.

O aumento do número de roubos em ônibus e de celulares foi sentido na pele por um funcionário público, de 23 anos, que foi vítima de dois assaltos em pouco mais de um mês, entre julho e setembro. Com medo de represálias, ele pediu para não ter seu nome divulgado. Nos dois roubos, X. perdeu dois telefones e dois fones de ouvidos. Os crimes ocorreram em São João de Meriti, na Baixada.

Após o primeiro roubo e sem dinheiro para comprar um celular novo, a vítima conseguiu com um amigo um empréstimo de um aparelho usado. Há duas semanas, foi rendido por homens armados durante uma caminhada:

— Dois desceram dos carros. Um ficou me rendendo e outro veio e pegou o celular que eu usava por empréstimo. Nunca imaginei que fosse ser assaltado duas vezes em tão curto espaço de tempo assim.

Tendência era esperada

Para Ignacio Cano, sociólogo, professor da Uerj e membro do Laboratório de Análise da Violência, a queda do início da pandemia, seguida do aumento dos delitos de roubos, em julho, eram mesmo esperadas.

— A queda brusca dos registros criminais é normal em momento de confinamento, especialmente em crimes de rua como roubo a pedestre e roubo a celular, roubo a ônibus. Na medida que o deslocamento da população diminui, esses crimes obviamente vão diminuir. Então, a queda é mais do que esperada. E o aumento posterior também é esperado, na medida em esse confinamento, essa reclusão das pessoas, a limitação da mobilidade, vai aos poucos desaparecendo. A gente esperava esse aumento. Quanto à última evolução em agosto, é difícil dizer. Em alguns crimes, essa evolução é bem menor e aí teríamos de ver a série histórica, o comportamento dos crimes ano a ano. Mas a queda inicial e o aumento em julho são mais que esperados nesse contexto de limitação dos deslocamentos das pessoas — disse Cano.

O também sociólogo Daniel os Hirata, professor de Sociologia da UFF e coordenador do Núcleo de Estudos dos Novos Ilegalismos, afirmou que considera a hipótese de o aumento dos crimes de oportunidade estarem ligados ao maior número de pessoas nas ruas. Ele disse, porém, que precisa analisar os números com maior profundidade.

— Como é hipótese é possível dizer que o maior número de pessoas nas ruas favorece a ocorrência de roubos, aos crimes de oportunidade — afirmou ele.

 

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